SETE DIAS NUM SPA

PROJETO CAMILA PITANGA 2006

Iniciei 2006 com uma meta importante, o Projeto Camila Pitanga 2006. Eu ia ficar sempre bronzeada e magra. Mas eis que existe o Fiteiro ao lado do trabalho e eis que existe Ivany com proposta indecente. E eis que a gente vive naquele lugar comendo caldinho de feijão com torresmo. Quilos a mais, ok! Mas o bronze de praia permaneceu. Resultado: o projeto Camila Pitanga foi abortado e deu lugar ao Preta Gil 2006.

Não sei se foram os torresmos ou o estresse do dia-a-dia, certa feita fui ao Hospital Esperança e, daquela vez, não era pra reunião. Estava com arritmia. E tinha algumas outras ziguezirazinhas básicas: respiração ofegante, cansaço extremo e dor em tudo o que é canto. A lombar me matava, o tornozelo direto me deixou manca (depois da queda em SP), asma até umas horas e sensibilidade à flor da pele. Uma verdadeira mazela! Meu médico foi taxativo: “TEM QUE PARAR! OU PÁRA OU MORRE!”

Pense num medo... Aí, Ivany deu a solução (como sempre): vamos para o SPA, você não precisa fazer a dieta, mas faz caminhada, exercícios, conhece gente nova... Pois sim! Pensei: eu relaxo e faço a dieta, sim! Quem não quer perder peso? Somos perfeitas, claro, mas tínhamos, digamos, “pequenos ajustes” a serem feitos.


- Agora, parar, parar não dá né? Levei todo o material de trabalho e usei a Lan House de São José da Coroa Grande pra ler os jornais e enviar a produção diária por e-mail.

1º DIA
Fomos eu, Ivany e a mãe dela (que é a merma coisa dela, numa intensidade maior). De nariz empinado numa EcoSport, Ivany é informada para não perder a entrada de Porto de Galinhas (Estávamos indo para Maragogi). Ela: “Oxi, pode deixar, menino! Tô ligada demais”. Bem, vou resumir. Na conversa animada (pense, Ivany e a mãe de Ivany conversando...), a doida perdeu a curva e foi bater em Charneca que, se não é o fim do mundo, é bem pertinho. Vamos perguntar pra que lado é, né? Aí, ela para o carro e eu pergunto a um ômi pra que lado era Maragogi. E ele diz: “Maracuji?” E eu: sim!!! Antes dele começar a explicar, Ivany sobrepõe a sua altiva voz e explicita MARAGOGI. Aff, o póbi disse: “sim, Maracuji, oia, você toma o rumo da venta, dobra às esquerda, tem um trevo e pronto”. O coitado querendo ser gentil e Ivany corrigindo o moço. Sei não... Pense que uma viagem de duas horas virou de quase três. E eu com fome.
Chegamos no SPA, colocamos as coisas no quarto e fomos tirar medida, verificar o peso, a pressão, essas coisas básicas. Tivemos uma recepção de boas vindas, regada a sucos variados. Achei estranha a coloração dos sucos e perguntei a Ivany do que era feito. Depois de rir muito, ela explica: “Ah, Aninha, suco de SPA é assim, chamam de água suja. Os sucos mudam apenas a cor, mas todos têm gosto de água e adoçante. A gente tem que mentalizar muito para sentir o gosto da fruta. O de pitanga, por exemplo, é salmão; o de Abacaxi é quase incolor, o de goiaba é rosa-bebê”. Minha gente, se não fossem as plaquinhas, eu achava que era tudo igual. Pense num negócio ruim! Multiplique por 100! É pior ainda... Sim, nada de Coca Light, pois tem potássio ou é sódio que dilata o estômago. Sete dias sem meu vício. Será?
Nota de Ivany: o sódio retém líquido e o gás dilata o estômago.

Vejam que cena linda: abri o frigobar e ele era assim! Que desespero...


AS PRIMEIRAS REFEIÇÕES
Fomos almoçar. Eu já estava consciente de que a ração seria pouca e não criei muitas expectativas com relação ao prato. Pouquinho de cenoura misturado com um pouquinho de folhas e um pouquinho de frango. Quase choro, mas pensei: eu vou ser magra! Eu vou ser magra!
São 600 calorias por dia. Ninguém merece. Isso é um negócio de corno mermo. E o jantar? Menino, o jantar foi um caldo amarelo, ralo que nem caganeira aguada. Depois veio uma salada de quase nada que finalizem com duas garfadas. Perguntei logo à nutricionista: tem alguma coisa a mais? E ela, mais tarde tem um lanche. E eu: OBAAAAAA, é o que? E ela: meia pêra. Agora, fala a verdade, como é que uma pessoa tem a capacidade de deglutir meia pêra? Bateu o arrependimento, mas pensei: vou ser magra, vou ser magra!
Nota de Ivany: mastigar gelo é uma ótima solução pra ficar se enganando.




SEGUNDO DIA
Acordei mal humorada e louca para tomar café da manhã. Perdi um quilo e a doida perdeu mais. Ela, mais uma vez, me alertou para a pouquidão da comida. Continuei com algo de nada, de vazio oco dentro de mim.
Fomos caminhar pela pista. Eu, com todo meu preparo físico, fui caminhar de malha e tênis novos. Quando deu cinco minutos, perguntei à Ivany se faltava muito e ela riu. Andamos uma hora e parecia que não ia ter fim. Eu me senti no caminho de Santiago de Compostela. Só faltava o cajado.
Cheguei com meio palmo de língua de fora e fui fazer um tratamento chamado forno, no qual eu era untada com óleo Paixão, coberta por mantas e ficava embaixo de um negócio quente pa peste. Da cama onde eu iria permanecer meia hora cozinhando, eu tinha a visão e a audição do inferno. Um monte de mulher nua, peitos flácidos, celulite, dobras múltiplas, bucho quebrado, e tudo. Eu e Ivany éramos duas musas (pense...).

A MÚMIA
Vejam a conversa que eu presenciei. Estavam duas senhoras na minha frente fazendo bandagem (são ataduras molhadas com cânfora e mentol que envolvem todo o corpo e a pessoa fica parecendo uma múmia. Tenho certeza que essa técnica foi inspirada no embalsamamento das múmias. Aí, pronto, Tutancâmon estava conversando com Akainaton e elas estavam de peito de fora. Chocante a cena. Uma tinha uns 50 anos. A outra, uns 60, com toda bondade que me é peculiar. Pois bem, Akainaton estava mostrando a cirurgia de mama a Tutancâmon, que (bicha ruim da peste) disse assim:


Akainaton – Adorei o doutor tal, ele fez minha cirurgia de peito perfeita.Veja, quase não tem cicatriz. Pode pegar... .
Tutancâmon (apalpando e com cara de desdém, como quem tá pegando em tomate podre na feira) – Menina e por que você não aproveitou e suspendeu também?
Aninha – (morrendo de rir dentro do forno)
Ivany – (lesa, não viu nada)
Akainaton – Eu suspendi, mas não posso fazer mais do que isso por conta da minha idade, né? Ficaria ridículo.
Tutancâmon – Pois eu nunca fiz nada, meus peitos são mais bonitos que os da minha filha.
Aninha – (pensando: putz, o que é pior do que aquela bucha)
Ivany – (continuou lesa, na massagem, sem ouvir nada)
Akainaton – Pois eu faço, tudo pra ficar mais bonita.
Aninha – (pensando: que forno quente do cacete, quero sair daqui)
Ivany – (perdeu a história toda)



TERCEIRO DIA
MIRAGENS
No terceiro dia, descobri que a restrição alimentar provoca visagens. Cheguei no terraço com um creme de cabelo de pote gorducho e de cor creme. Uma colega perguntou: “comprasse requeijão, foi?”. Morri de rir. No mesmo dia, eu estava na piscina e um grupo já estava à mesa. Perguntei a Ivany o que eles estavam comendo e ela me disse que estavam jogando baralho. Depois, enquanto uma menina enxugava a boca com um guardanapo, o outro perguntava se era tapioca. E no penúltimo dia, coloquei minha máquina fotográfica numa mesa e uma senhora jurou que era pamonha, já que a caixa é amarela.
CONVERSA DE SPA
E conversa de spa é interessante. Em primeiro lugar, a maioria das pessoas já fizeram SPA. E todas só falam em comida. O tempo inteiro. O prato tal, o restaurante tal, aquele camarãozinho, o penne não sei de onde... Todo mundo também fica comparando os pratos para ver se estão todos do mesmo tamanho. Também a maioria já fez algum tipo de plástica e ficam metendo o pau nos cirurgiões. Uma doida lá gastou oito mil pra botar os peito pra cima. Oito mil, pense...


QUARTO DIA
FALTA DE EDUCAÇÃO
SPA não é lugar para exercer a boa educação à mesa. Primeiro, porque os pratos vão chegando e ninguém é louco de ter a gentileza de esperar o prato do outro chegar para comer. Sim, e tem as comparações, algo do tipo: “sua alface é maior do que a minha. Você ganhou uma pitanga a mais”. E quando a comida escapole do prato para a mesa ou para a roupa, ela é prontamente levada à boca, sem qualquer culpa. Quando é sopa, empinar o prato é de praxe. Dá vontade de passar o dedo e tirar o restinho. Mas aí é demais...
Também comemos as sementes do tomate, a cascas de tangerina, a pêra a gente come até o talo. Agora descobri por que o povo fala “entrou até o talo”. O enfeite do prato? Oxi, sobrava não... Cada folhinha de manjericão, cada sementinha de romã era devorada.
Bem, come-se tão pouco que não é preciso escovar os dentes. Juro como não ficam restos alimentares na boca. Palito? Isso não pertence aos spasianos. Quando eu escovava os dentes, já nem cuspia a espuma de pasta da boca, engolia tudo. Pense numa fome do cão... Vou tentar dormir.




Sim, eu durmo de meias.

PRIMEIRA TENTAÇÃO DE CRISTO
Tínhamos que trabalhar e fomos a S. José da Coroa Grande a uma Lan House. Lá, não agüentei, dividi uma Coca Light com Ivany. Quem diria, eu dividindo minha Coca...


QUINTO DIA
SUBORNO, SABOTAGENS
Acredita que tem gente que vai pra SPA e leva comida? Pior, come escondido. Eu fiquei incrível: o povo subornava garçom, roubava batatinha, comia resto de comidas que ficavam nas mesas dos hóspedes não spasianos. Vi uma mulher pedindo um pouquinho de pipoca à uma pirralhinha. O cúmulo.
TOYOTA – Bem, eu odeio sentir fome e tô toda me tremendo. A médica disse que eu fico de mau humor na hora das refeições. E fico mermo. Cearense com fome não rola não. Estou aprendendo a valorizar as pequenas coisas da vida, tipo pão com ovo, arroz com feijão e cremicraque com margarina. Ai, como eu queria uma Vitarelazinha básica...
SEGUNDA TENTAÇÃO
Fomos a Maragogi comprar o presente do amigo secreto (sim, teve esse mico também, nem me lembre...). Lá, uma Coca Light me chamou, mas o peso na consciência (consciência cearense, lembra?) era muito. Dividimos para três. Puta merda, cada lata tem 365ml, o que significa que cada doido tomou pouco mais de 120ml. É o fim dos tempos.


SEXTO DIA
TERCEIRA TENTAÇÃO
EU CONFESSO: Eu me estressei com o trabalho e comi chocolates. Dois Charge, um de leite moça e um Choquito. Ou comia ou morria. Me lasquei, amanhã vou engordar.

TATUAGENS
Ivany sugere que façamos tatuagens de henna. Legal, idéia aprovada. Ela fez uma estrelinha no ombro e uma letra no pulso. Eu fiz uma bonequinha meiga no pescoço e uma letra no pulso. Terminado o serviço, perguntei se era daquele jeito mermo e o tatuador disse que era só esperar secar. Mas quem tem uma Ivany ao lado não espera nunca. Pense numa mulher que precisa de três metros de circunferência para poder falar... Espaçosa demais, cabelo demais, gesticula demais. Afe. Bem, ela borrou a estrela na blusa, foi consertar e borrou a do pulso também. Aí, pedi que a anta ficasse parada para que eu reparasse a merda. Claro que ela borrou a minha também. A estrela foi batizada de decadente. E a boneca, que era meiga no papel, mais parecia uma canibal africana no meu pescoço. O cão.

Eu e a canibal

Ivany e a estrela decadente

RESUMO DA HISTÓRIA
SPA é um lugar que a gente come quase nada, entope o bucho de água com adoçante na doce ilusão de enganar a fome. E tome banheiro. O povo só fala em comida e é tudo olho grande. Temos que botar o bucho e a bunda pra cozinhar no forno, usar faixas que congelam de frio, caminhadas de matar, massagens violentas e conversa com um bando de doido. Tudo isso tendo que levantar às seis. Foi muita informação pra uma pessoa estressada e sedentária. Pois bem, estou bronzeada e com três quilos a menos. Agora vou pra o Fiteiro, tomar um bom chopp e comer caldinho com torresmo, pão de alho, coxinha, empada, pastel. Salta aê uma caipirosca com adoçante que eu tô diet! Ai que vontade de comer bode.